as imagens vistas de perto

O desenvolvimento das técnicas de impressão em massa possibilitou a reprodução de imagens em larga escala e a custos mais baixos. Entre o final do século 19 e começo do século 20, milhares de imagens circularam entre as pessoas - em cartões postais, livros, jornais, catálogos. O que será que acontece quando ampliamos essas imagens a nível microscópico?

É TUDO FOTO? OLHe MAIS DE PERTO 

Parecem fotografias a olho nu, mas será que são mesmo? As imagens produzidas a partir dos processos fotomecânicos podem ser confundidas com fotografias, mas a aparência pode enganar! Diferente da fotografia, as impressões fotomecânicas são produzidas a partir de uma matriz, como uma espécie de carimbo. No processo fotomecânico, a técnica fotográfica é utilizada para registrar o tema desejado – uma obra de arte, uma paisagem, um evento – e uma outra técnica de impressão mecânica é utilizada para reproduzir essa imagem, garantindo uma tiragem em massa.

A demanda por mais imagens está na base da invenção e aprimoramento de diferentes técnicas de impressão. O processo fotomecânico conjuga a técnica fotográfica com uma técnica de impressão. Você sabia que um dos jeitos de diferenciar uma fotografia de uma impressão fotomecânica é olhar mais de perto, ou melhor, olhar a nível microscópico? Nessa curadoria, vamos investigar três técnicas fotomecânicas: a fototipia, a rede de pontos e a rotogravura. Já imaginou quais informações podemos obter a partir de uma análise tão próxima das imagens?

Exemplos de impressões fotomecânicas (técnicas variadas)

Ambas as imagens são aproximações microscópicas em 200x de diferentes pontos da fotografia: 4 – COLLECTIONS D’ART DE LA VILLE DE PARIS (PALAIS DES BEAUX-ARTS) XAVIER BARTHE LA PRIÈRE – ND PHOT.

Com o microscópio, enxergamos texturas que se diferenciam entre as fotografias e as impressões fotomecânicas. Mas como saber qual é qual?
A imagem fotográfica é resultado de um processo fotoquímico. Basicamente, a fotografia se faz a partir da captação óptica de um objeto que é projetado em

uma superfície, um papel por exemplo, sensibilizada com sais de prata que são expostos à luz. Quando ampliamos a imagem fotográfica com o microscópio, vemos que sua textura é suave e delicada, com grãos finos de aparência metálica e brilhante. 

características dos impressos

Já as impressões fotomecânicas são imagens produzidas a partir de uma matriz por um processo mecânico de impressão por meio de um maquinário capaz de produzir diversas cópias. Enquanto a fotografia analógica é obtida por um processo físico-químico que passa por etapas como a revelação e ampliação, os processos fotomecânicos são resultantes de matrizes físicas, que geram imagens gravadas através de pigmentos.

A principal diferença entre esses dois processos é que a fotografia é uma maneira de obter a imagem fotográfica, enquanto os fotomecânicos são modos de reproduzir essa imagem.

Nas ampliações de impressões fotomecânicas é possível observar diferentes texturas presentes em uma única imagem! Isso ocorre porque a quantidade de tinta varia para representar regiões de alta, média ou baixa luz. Ou seja, quanto mais luz, menos tinta e quanto menos luz, mais tinta. A complexidade tonal das  imagens impressas só é visível porque há milhares de filtros que interpretam materialmente a luz. É por causa dessa variação de padrões ópticos interpretados materialmente que podemos ver as nuances e os contrastes das imagens. Vamos conhecer alguns deles.

Exemplos de impressões fotomecânicas (técnicas variadas)

rede de pontos, uma técnica fácil, barata e popular

A rede de pontos foi introduzida por volta de 1880, foi W. H. Fox Talbot quem patenteou o uso de telas têxteis em 1852. Porém, a técnica se desenvolveu com contribuição de G. Meisenbach, Frederic Ives e Max Levy. De 1900 a 1960 esse processo dominou a produção em massa de impressões fotográficas, por ser uma técnica barata e fácil de ser feita. Foi um procedimento utilizado para impressão de livros, revistas, jornais, produtos de decoração e propagandas. Atualmente, a impressão por rede de pontos é feita de outra maneira, podendo ser inclusive reproduzida por meio de programas de edição de imagem.

É um processo de impressão que traduz os variados tons de uma imagem em um padrão de pontos com diferentes tamanhos. A quebra da imagem em pontos torna possível a reprodução mais certeira de todos os tons presentes na imagem. A profundidade dos tons é determinada pela aglomeração de pontos e não por uma maior quantidade de pigmento, é a concentração e a dimensão desses pontos que dá a diferenciação de luzes, sombras e meios tons para o resultado final da impressão. Dessa mesma forma, é a quantidade de pontos e a variação de seus tamanhos que determina a cor dos elementos na imagem impressa.

O negativo da imagem é copiado para uma matriz de metal coberta por material fotossensível. As partes que não eram expostas eram solúveis e então eram retiradas da placa. O processo de impressão utilizado era plano-plano, ou seja, uma matriz plana e uma prensa plana sobre o substrato, no caso o papel. Esse processo era lento, o que dificultava impressões em grandes quantidades, apesar de ser um dos mais utilizados. 

fototipia, entre rachaduras e formas definidas

A fototipia foi inventada em 1855 por Louis Poitevin e em 1859 F. Joubert publicou a primeira impressão feita com esta técnica (até 1868 houveram aprimoramentos importantes no processo). A matriz era feita a partir de uma placa coberta com uma gelatina sensível à luz. Para transmitir a imagem fotográfica para a matriz, um negativo fotográfico era colocado em cima da gelatina, que endurecia ao reagir à luz que passava pelas partes mais transparentes do negativo. As partes menos transparentes do negativo não deixavam a luz passar direito e a gelatina endurecia menos. Posteriormente, as partes que receberam menos luz repeliam a tinta e quando pressionadas contra um papel formavam as áreas mais claras e as partes mais endurecidas retiam mais tinta e formavam as áreas mais escuras. A matriz era então aquecida e banhada com água fria. Os micropadrões de minhoquinhas que vemos nas ampliações são as impressões das rachaduras que se formam nesse processo de aquecimento da gelatina.

Essa técnica fotomecânica produz imagens de muita qualidade, com um preto profundo e formas bem definidas. Menos utilizada hoje em dia, foi muito utilizada na impressão de cartões postais e é usada em trabalhos de fine art até os dias de hoje.

Cilindros e tinta para grandes tiragens, a Rotogravura

A rotogravura foi introduzida por volta de 1895 por Karl Klic e é utilizada até hoje. Apesar de seu custo elevado e longo tempo de produção, é recomendado para impressões de tiragens maiores, em grande quantidade. Um de seus usos mais conhecidos é na impressão de jornais e revistas. 

Nesse processo, a matriz é cilíndrica. A imagem que se pretende replicar é gravada em cilindros metálicos, normalmente de cobre. A reprodução gravada fica em baixo relevo e a tinta vai se depositando nas cavidades criadas por esse relevo, conforme o cilindro passa por um tinteiro e o excesso de tinta é retirado com uma espátula.

Assim, a concentração de tinta segue a profundidade do relevo. Quando o substrato (normalmente é um papel) passa por esses cilindros, ele é pressionado contra a superfície metálica e retira a tinta que está depositada. 

As impressões que resultam desse processo podem ser tanto coloridas quanto preto e branco. O processo parece bem complexo, mas se pensarmos nas imagens de grandes rolos de papel jornal passando por cilindros que aparecem em diversos filmes, fica mais fácil de se assimilar.

um projeto de pesquisa

Entre dezembro de 2021 e novembro de 2022, teve vigência o projeto de pesquisa dedicado ao tema das materialidades das técnicas fotomecânicas. O grupo envolvido mobilizou os álbuns de cartões postais da coleção Olga de Souza Queiroz, do Museu Paulista da USP, para estudar a materialidade das reproduções de imagens contidas neles. Com um microscópio óptico, foram vistas ampliações de até 200 vezes, o que permitiu identificar e registrar diferentes padrões de impressão. 

Imagem: 18 – CHÂTEAU DE CHANTILLY. L’ENTRÉE. ND PHOT.

O Museu Paulista possui em seu acervo outras coleções de impressos gráficos, como cartões postais, rótulos, embalagens e catálogos de arte que apresentam as mesmas técnicas de impressão. Veja a curadoria sobre cartões postais aqui e também a curadoria sobre os álbuns de viagens de Olga de Souza Queiroz aqui. Fique à vontade para explorar.

Ao longo da pesquisa, foram selecionados alguns desses impressos para o estudo e foi estabelecida uma metodologia de análise que compreendeu 3 pontos de ampliação para cada postal analisado. Sempre foram escolhidos pontos de baixa, média e alta luz para aproximar e tentar ver o comportamento da malha gráfica de impressão, estabelecendo, assim, amostras de natureza similar para comparação. 

Imagem: MADRID. – MUSEO DEL PRADO.


Para saber mais

BANN, Stephen. Parallel Lines. The Getty Conservation Institute, Los Angeles, 2013.


KAPLAN, Art. STULIK, Dusan C. The Atlas of Analytical Signatures of Photographic Processes – Collotype. The Getty Conservation Institute, Los Angeles, 2013.


Verbetes “Collotype” pp. 313-314; “Photomechanical: Minor process” pp. 1118-1119; “Poitevin, Alphonse Louis” pp. 1139-1140 In: “Nineteenth_Century_Photography” by Taylor & Francis Group, LLC Routledge is an imprint of Taylor & Francis Group, an Informa business, 2008.

curadoria por:

ana julia pradas

Ana Julia Pradas é graduanda em História pela Universidade de São Paulo e participou do projeto “O Museu do Ipiranga na cultura digital – pesquisa e democratização de acervos” sob orientação da Profª. Solange Ferraz de Lima.

daniel cruciol

Daniel Cruciol é graduando em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo e participou do projeto “O Museu do Ipiranga na cultura digital – pesquisa e democratização de acervos” sob orientação da Profª. Solange Ferraz de Lima. 

georgia sharp

Georgia Sharp é arquiteta e urbanista pela FAU-USP, trabalhou para a reabertura do Museu do Ipiranga em 2022 e integrou o grupo de pesquisa “O Museu do Ipiranga na cultura digital – pesquisa e democratização de acervos”, sob orientação da Profª. Solange Ferraz de Lima.

victor muscalu

Victor Muscalu é graduando em História pela Universidade de São Paulo. Participou do projeto “O Museu do Ipiranga na cultura digital – pesquisa e democratização de acervos”, realizando parte das microscopias desta exposição e definindo coletivamente os critérios para as maximizações. Atualmente media visitas às exposições do Museu do Ipiranga pelo Educativo da instituição.

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