UMA BREVE HISTÓRIA DOS RETRATOS
O retrato é por definição a representação de uma figura só ou em grupo, produzida a partir de um modelo vivo ou documentos que ajudem a elaborar a imagem do retratado. É um gênero que comporta diversos suportes, podendo se ter retratos em forma de escultura, pintura e fotografia. Existente desde a época da antiguidade, como no Egito e na Grécia, os retratos se tornam um gênero autônomo no século 14. A produção dos retratos estava muito ligada aos anseios da corte, e posteriormente da burguesia, em projetar suas imagens na vida pública e privada. É no século 19, com o desenvolvimento de técnicas fotográficas, que os retratos começam a se popularizar. Tornam-se, então, objetos da modernidade oitocentista e atendiam ao desejo de distinção de segmentos sociais antes alijados de meios de obter uma representação visual de si.
APRESENTAÇÃO PÚBLICA DO SUJEITO
O retrato se constitui como uma forma de representação do sujeito a ser eternizada na sociedade e que pode circular sem a sua presença física por diversos lugares. Por isso, todos os elementos que o compõe são controlados para a produção de uma identidade social e pública – a pose, a indumentária, o cenário. Esse controle dos elementos e da composição formal dos retratos tem longa tradição na pintura à óleo de aristocratas, reis e rainhas europeus. No Museu, essa tradição é evidente na representação dos bandeirantes, como por exemplo na pintura de Domingos Jorge Velho, de autoria de Benedito Calixto, que pode ser vista na exposição Passados Imaginados (sob a curadoria de Paulo César Garcez Marins), no Museu do Ipiranga.
Na produção de retratos fotográficos produzidos em estúdios é possível identificar poses semelhantes, sobretudo nos retratos masculinos, que disseminam padrões de representações típicas da retratística na pintura.
SOCIABILIDADE, AFETIVIDADES E RETRATOS
Entre o final do século 19 e as primeiras décadas do século 20, os retratos fotográficos eram produzidos em formatos e tamanhos padronizados, entre os mais comuns estão o cabinet portrait e o carte de visite.
Ainda que dentro dos rígidos padrões da pose, os retratos fotográficos cumprem funções afetivas e são suportes de afirmação de laços sociais. Por exemplo, os retratos de grupos familiares apresentam uma composição cênica recorrente, onde as figuras paterna e materna ocupam posições centrais, com descendentes ao redor ou no colo. Os retratos de grupos familiares ou de amigos também permitem identificar laços afetivos indicando vivências mais íntimas. É o caso de abraços entres homens, que são recorrentes, e mais comum do que entre mulheres. É interessante notar como alguns padrões do retrato fotográficos alimentaram também a produção de pinturas, como o exemplo do retrato de dois homens abraçados na pintura de Van Emelen.
O CORPO EM POSE
Na coleção de retratos fotográficos de Militão Augusto de Azevedo (1837 – 1905), percebe-se que a restritiva distinção de gênero naquele período era produzida e reforçada neste suporte também, as imagens dos retratos masculinos mostram uma maior riqueza de posturas corporais enquanto os corpos femininos estão quase sempre em poses rígidas, em prontidão.
O POTENCIAL DOS ESTUDOS COM RETRATOS FOTOGRÁFICOS
Na busca pela criação de identidades por meio dos retratos fotográficos, o uso de artefatos para a produção de características individuais e sociais foi de extrema importância. Uma análise dos cenários fotográficos, dos objetos e das vestimentas usadas pelos retratados permitem compreender gostos e formas de distinções entre grupos sociais. Para além de práticas concretas, a experiência nos ateliês fotográficos decorados com ícones do refinamento da burguesia, possibilitou para parte da população sonhar com uma vida diferente. Os estudos com retratos possibilitam compreender a sociedade que o produziu.
Para Saber Mais
Marins, Paulo César Garcez. Nas matas com pose de reis: a representação de bandeirantes e a
tradição da retratística monárquica européia . Revista Do Instituto De Estudos Brasileiros, (44),
77-104, 2007.
https://doi.org/10.11606/issn.2316-901X.v0i44p77-104
CARVALHO, Vânia Carneiro de LIMA, Solange Ferraz de;. Cultura visual e
curadoria em museus de história. Estudos Ibero-Americanos, Rio Grande do Sul, v.
31, n. 2, p. 53-77, 2005.
https://doi.org/10.15448/1980-864X.2005.2.1338
curadoria por:
Guilherme Domingues Gonçales
Guilherme Domingues Gonçales é historiador formado pela UnB, mestre em História Social pela
FFLCH-USP. É autor do livro Mulheres engravatadas: moda e comportamento feminino no
Brasil,1851-1911. São Paulo: Editora Intermeios,2020. guilhermegoncales@gmail.com.