Em 2017, cinco após o fechamento do edifício-monumento que abrigava exposições, reservas técnicas, laboratórios e áreas administrativas do Museu Paulista, firmamos uma parceria com o Grupo de Usuários Wiki no Brasil (hoje denominado Wiki Movimento Brasil). A proposta trazida pelo professor do curso de jornalismo da Cásper Líbero (SP) e wikipedista João Peschanski configurava uma excelente oportunidade para inserir o Museu e seu acervo no meio digital, em um momento delicado de sua trajetória. A atuação e a filosofia do movimento wikipedista estavam alinhadas com a visão do Museu Paulista enquanto museu público identificado com a ação educacional: disponibilizar o acervo documentado e o conhecimento produzido a partir dele de forma ampla e gratuita.
Após a aprovação da iniciativa pelo Conselho Deliberativo do Museu Paulista, as equipes deram início ao projeto. Os primeiros desafios para a empreitada eram de ordem jurídica. Definir quais itens de acervos poderiam ser disponibilizados sob licença livre. Outro desafio foi organizar o fluxo capaz de alimentar as plataformas Wikicommons e Wikidata com as reproduções digitais e os metadados disponíveis em nosso sistema documental informatizado. E, por fim, era necessário proceder a uma operação de validação e correção dos metadados pouco consistentes (com erros de grafia, ou datação).
Na primeira fase da parceria, as atividades foram desenvolvidas por profissionais do Museu Paulista em conjunto com bolsistas que atuavam no Cepid NeuroMat (apoio FAPESP), sediado no Instituto de Matemática da USP. Os documentos iconográficos já em domínio público ou que já detinham licenças de uso pelo museu foram os primeiros a integrar a wiki, conformando o WikiGlam Museu Paulista. Ao longo do projeto, outros parceiros surgiram: o Instituto Goethe (SP), o Instituto Laramara (SP). Assim, partir de 2017, o Museu passou a disponibilizar conteúdos e imagens de suas coleções que podem ser baixadas gratuitamente. Hoje já temos mais de 33 mil imagens em alta resolução que podem ser utilizadas livremente. Ao longo do processo, foram realizadas oficinas de caráter técnico para qualificar as equipes do museu e bolsistas do projeto e aconteceram as primeiras maratonas de edição de conteúdos relacionados aos acervos do Museu Paulista.
Em 2020, o projeto ganhou nova dimensão, graças ao apoio da Fundação Banco do Brasil ao projeto Novo Museu do Ipiranga. Pudemos ampliar a realização de eventos e desenvolver aplicativos focados na qualificação dos acervos. Assim, maratonas de edição, criando ou melhorando verbetes, foram intensificadas, investindo em temáticas relacionadas com as linhas de pesquisa e com as coleções do Museu Paulista: São Paulo Fotográfica, Os indígenas no Museu, Mulher, Arte e História, As águas do Museu Paulista, Lutas pela Independência do Brasil, Santos Dumont, Cartografias e Territórios. Além das maratonas, promovemos dois wikiconcursos com premiação, sendo que o segundo foi dedicado a um dos temas do nosso programa de exposição – a Casa Brasileira. Boa parte das atividades aconteceu durante a pandemia e no modo online – no caso das maratonas, os webinários apresentavam o tema geral e as orientações para a criação ou melhoria de verbetes, transmitidos pelas redes sociais e ficaram gravados no canal do Youtube.
A visualização dos acervos e as interações com milhares de usuários de diferentes segmentos e faixas etárias teve um alcance nunca antes vivido pela instituição e, hoje, joga luz sobre as possibilidades de uma curadoria compartilhada nas etapas de qualificação dos itens dos acervos. Como parte das estratégias digitais adotadas, esse tipo de curadoria traz para o centro das atenções uma revisão importante não só sobre o perfil de acervos adquiridos nos últimos 30 anos, que amplia a representatividade social, etária e de gênero na instituição, como da sua forma de atuação na sociedade – o quanto a cultura digital e ações como essas, desenvolvidas em plataformas de alcance mundial serão capazes de fomentar canais de diálogo com a sociedade?
Como essas iniciativas afetarão as nossas políticas de aquisição de acervos e de pesquisa, ainda não sabemos. No entanto, alguns exemplos apontam o campo fértil que se abre. Por exemplo, propostas de doações alinhadas com nossas temáticas, estimuladas pelas maratonas de edição, possibilidade de corrigir informações sobre um determinado artefato e até mesmo entender o funcionamento de outro. As imagens da região central da cidade de São Paulo, produzidas por Werner Haberkorn nas décadas de 1940 e 1950, por exemplo, foram apropriadas de forma nova por um grupo de pesquisa interessado em mapear e identificar as as marcas industriais em exposição publicitária pela cidade.
Foi com esse propósito, buscando tornar lúdico e acessível as formas de participação pública nas práticas cotidianas do museu, que a equipe de TI do WMB desenvolveu cinco aplicativos interativos nos quais podemos experimentar como extrair informações dos objetos para criar metadados mais consistentes. Projetos dessa natureza têm o potencial de promover e fortalecer laços e compromissos de um museu público como o nosso com a sociedade, considerando a sua pluralidade de sujeitos.
Visite a nossa página Wikiglam Museu Paulista e os projetos desenvolvidos aqui:
Livro semântico: As fotografias de Guilherme Gaensly no acervo do Museu Paulista
Os aplicativos de curadoria de metadados: Wiki Museu do Ipiranga: Quantos tem?, Wiki Museu do Ipiranga: Com que roupa eu vou?, Wiki Museu do Ipiranga: Qual a marca?, Wiki Museu do Ipiranga: Para que serve?, Wiki Museu do Ipiranga: Qual o ornamento? e Wiki Museu do Ipiranga: O que há no brasão?.